CHAT

As "conversas" ao estilo "chat" metem-me medo. Pessoalmente entro em depressão quando leio tanto K, tanta abreviatura de qd, tb, dok, ck e outras tantas que nem conheço. Admito que todos nós, a menos que morramos muito cedo, chegamos a uma altura da vida em que, por mais evoluídas e "abertas" que sejam as nossas cabecinhas, nos tornamos antiquados, por vezes rezingões, numa palavra – cotas. Até aqui tenho vindo a encontrar justificações aceitáveis para os meus conservadorismos, parece-me, mas a verdade é que não me podia estar mais "nas tintas" relativamente ao carácter "aceitável", ou não, das minhas justificações. Há coisas às quais espero nunca ceder, particularmente à idiotice, esteja ela "in" ou "out", seja ela um passaporte para a linguagem "cool" ou uma condenação.


Uma destas noites estive em "chat via Messenger" com alguém que vive do outro lado do mundo. A experiência não foi nova mas havia muito tempo que não o fazia. Conheço pessoas, algumas muito próximas, que vivem noutros Continentes e, aqui há uns anos, "conversávamos via Messenger" com alguma frequência. Depois... as vidas mudam, falamos mais ao telefone, etc.

Como estava a dizer, uma destas noites estive na "conversa via Messenger"... e o resultado espantou-me, já não me lembrava de que é possível, sem k's, sem abreviaturas enervantes, com graça. Não resisto, com a licença de quem é devida, a deixar aqui um bocadinho. Clikem com os vossos amigos na rede, é uma curte!


1 – Olá! Diz-me se estás ai… Estás?

1 - Não estás?


2 – Olá… Estou… a tentar saber se estou aqui.


1 – Ah… Queres tele-transportar a tua mente até aqui?

2 – Está bem… espera, tenho de parar de escrever e estalar os dedos para o conseguir.

2 – Pronto, já aí estou. Consegues “ver-me”?


1 – Perfeitamente. Pareces-me bem esta noite.

2 – Estou bem mas ainda não consigo ver-te claramente, tenho de habituar os olhos à tua luz. Expõe-te um pouco mais, sim?

1 – Sabes que não me é fácil…

2 – Será que albergas em ti um vampiro?

1 – Provavelmente, como todos nós… uns mais vampiros do que outros… Não tens vontade, ou necessidade, de vampirizar de vez em quando?

2 – Hum… Tenho de pensar… Se considerar “vampirizar” como – alimentar-me de – então “vampirizo”; se considerar como – sugar encapotadamente – , então creio absolutamente que não.

1 – E de que te alimentas tu quando "vampirizas"?

2 – Do mesmo que todos nós, provavelmente, ou muitos de nós, talvez melhor dizendo.
Neste momento estás a vampirizar-me respostas que não quero dar-te; se as queres tens de procura-las.

1 – Gosto particularmente de "vampirizar" respostas…

2 – Não te posso levar a mal mas terás de compreender se resisto a dar-tas; ainda agora reconhecias que não te é fácil expores-te.

1 – É verdade mas tu consegues fazê-lo com enorme à-vontade, por vezes até só para provocação de uma similar reacção alheia, se para tanto houver inteligência e coragem...

2 – Seja. E se bem te entendi, agradeço. Mas o que disse não foi que não quero dar-te respostas para não me expor, nem tão pouco o meu pensamento passou por aí. Não quero dar-te respostas porque é uma maneira de “vampirizar” a tua atenção, caso a tua curiosidade (te) o justifique.

1 – "Vampirizas" atenção...

2 – Como quase todos nós... mas não a sugo. Aliás tenho sérias dificuldades em suportar esse tipo de vampirismo, mesmo quando o compreendo. Há situações que me comovem mas, e contra mim falo, só me apetece fugir.
Pronto, ganhaste uma resposta, agora é a minha vez.


1 – A tua vez de ganhares o direito a uma resposta, se bem te entendo...

2 – Claro!

1 – E qual é a pergunta?

2 – Ah-ha! Não posso fazer-ta, teria de expor-me de novo

1 – Chegámos a um impasse?

2 – Não creio, basta seres Tu a fazer uma nova pergunta...

1 – E se for um insulto vingativo?

2 – Também resulta (como poderás ter acabado de te aperceber, já tardiamente) mas fica-te mal.

P – Fico-me por um pensamento... E se queres uma nova pergunta:

2 - Então? Esta coisa a piscar no ecrã começa a hipnotizar-me...

1 - A ideia é essa... aqui vai: Qual é a pergunta que gostavas que te fizesse?

2 – Eu ? Eu gostava que me fizesses uma pergunta determinada?

1 – Pediste-me uma pergunta...

2 – Uma que tenhas a bailar-te na cabeça para me fazeres.

1 – Eu? Eu tenho perguntas a bailarem-me na cabeça para ti?

2 – Não?

1 – Sim.

Várias, algumas já velhas, algumas que tenho de relembrar de vez em quando porque não as quero esquecer. Algumas ficaram desde o dia em que te conheci.


1 – Ainda aí estás?

2 – Bem, e por que não as fazes? Eu só pedi uma...


1 – Não as faço, agora, porque tu não responderias, e muito menos como eu gostaria que as respondesses – tu “dizes” muito do que dizes com o olhar; não “dizes” diferente, dizes de uma forma que não se escreve.

2 – Como toda a gente...

1 – Sim, mas em ti é notório, é uma forma de te expressares. Há pessoas que usam muito as mãos quando falam, outras usam muito a entoação, etc. Tu usas os olhos... muitas vezes nem precisas falar, um olhar e ficou dito.


2 – Fico à espera de um encontro olhos nos olhos.
Tu fazes-me as tuas velhas perguntas e eu não digo uma palavra mas prometo-te que não desvio o olhar

Já falta pouco para o Sol nascer por aqui, está na hora de os vampiros se recolherem...


1 – Como se tu fosses capaz de não dizer uma palavra... Só por aposta!
Vai e fica em paz.


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