DO REI, DAS ELEIÇÕES E DOS ELEITOS

Hoje veio ter comigo um "escrito" de 2010, quando se comemorou o primeiro centenário da república em Portugal. Se o escrevi há 11 anos hoje voltaria a escreve-lo com redobrada convicção, não só porque sou monárquica mas, fundamentalmente, porque sou profunda e irremediavelmente democrata.
No meio destes últimos 11 anos tem vindo a ser progressivamente comprovado o quanto a Democracia é frágil - impensavelmente frágil - e quanto o mais essencial RESPEITO pelos Direitos Humanos, mesmo até dos Direitos Civis, pode ser estruprado e ignorado por líders inimputáveis e, pior, por facções sabiamente enraivecidas  do próprio povo.

Uma semana passou sobre as últimas eleições presidenciais. Talvez não tenha razão mas a sensação que tenho é de que grande parte dos eleitores votantes escolheram "o do mal o menos", o "mais alinhado" ou o "menos alinhado". Claro que houve quem votasse por convicção, tão claro quanto os muito mais eleitores que não votaram: os que "se estão nas tintas", os que "não estão pra-isso" e os muitos que nem encontraram em quem votar.


A Democracia é frágil, ponto assente
As republicas, que, reconheço, serão um conceito ideal no papel, resultam nisso mesmo, num
idealismo longínquo porque não se podem furtar às ambições dos homens amplificadas pelo mais eficaz dos fertilizantes: o Poder
. E isto em ciclos periódicos eleitorais.
 
São necessários esses ciclos? São, constituem o âmago do processo. 
Têm de ser absolutos? Não, há uma identidade supra-eleitoralista que pode permanecer, alheia a sufrágios, ideologias e interesses, una no que constitui a identidade do que nos define histórica e culturalmente enquanto povo.

_______________________________________


CEM ANOS SEM REI -  1 Fev. 2010

O que me lixa não é que se comemorem os 100 anos da república, cada um é para o que nasce e "chacun s'amuse à ça façon".
O que me lixa é que se comemore o centenário da república como se a instauração da dita correspondesse à realização da vontade democrática do povo português; como se estivessem a celebrar 100 anos de democracia, ou lá que raio de sucedâneo de democracia é esta coisa em que vivemos actualmente.
A nossa suposta democracia é uma jovem prestes a completar 36 anos que, talvez por acumular erros de juventude e devido à sua descuidada cultura e educação, para já não falar de uma capacidade financeira que a tem vindo a comprometer na sua ética e na sua independência, apresenta um aspecto desgastado e pouco atraente.
Será por isso que agora tendem a confundi-la com uma centenária?

A república tem 100 anos e Portugal cumprirá este ano 867.
Quase tudo o que foi importante se passou nos primeiros 767

O que se fez destes últimos 100 anos em Portugal que faça deste país uma presença respeitável no mundo? Uma referência? Uma opinião ou um exemplo a ter em conta?

(Aquele vergonhoso programa de televisão sobre "Os 100 maiores portugueses" foi uma boa amostra...)

E não me venham falar das conquistas do povo na sua Liberdade, que é curta nos anos e encurtada no respeito, nos seus Direitos,  expressos ou não na Constituição, são de menos em menos observados, cumpridos e assegurados.
Não me falem de igualdade e, menos ainda, de fraternidade; não me falem porque atiro-me para o chão a rir e a chorar ao mesmo tempo, terão de chamar uma ambulância e vestir-me um casaquinho branco daqueles com muitas presilhas e fivelas.

Já sei, já sei, "a monarquia peca à partida porque o rei não é eleito, o rei é filho do rei".

Tenha um republicano uma empresa e vá lá eleger um director-geral que reúna o consenso do seu eleitorado (o pessoal da empresa), que seja supra-partidarices, e que tenha a educação e a formação apropriadas às suas funções... Uma gaita!
A ingenuidade tem limites e, quando não tem, é o descalabro.
Quem tem uma empresa quer ver à sua frente alguém que saiba da poda, que conheça os bons e maus caminhos, que saiba ler relatórios e contas, que saiba aferir das várias necessidades, o resto é conversa. Depois que se elejam representantes, comissões, etc, etc. mas não pode ser o Senhor Porteiro, que conhece toda a gente, é um gajo porreiríssimo e que conhece os cantos à casa que o bom senso fará eleger responsável pela empresa.
"Mas nada garante que o rei será um bom governante..."
O rei não é um governante numa monarquia moderna; O rei é a personificação do seu país, para isso é educado, é a estabilidade que permanece com tudo o que constitui uma Nação, não personifica nem se altera nas mutações normais e decorrentes da vida do Estado.

Obviamente que não falo contra o sistema democrático e eleitoral, longe de mim, defendo-o com unhas e dentes. Não é o sistema democrático que está em causa.

Não é possível um presidente da república ser consensual, ser apartidário, ser, de facto, o representante de toda uma nação. E não é presidente da república quem está, de facto, preparado para o ser, quem tem a educação e a formação para o ser; Ele é (apenas) quem é eleito, num acto político e, também, afectivo.

Vivemos de "Pai da nação em Pai da nação" como um povo orfão que vai mudando de pai adoptivo; um padrasto que serve vários interesses e, com muita sorte, até poderá defender os do povo que o elegeu durante o tempo que durar. E se o deixarem, caso não se trate de um regime presidencial.

Então e um rei, é sempre bom e consensual? Não, não é, mas também não é essa a sua função. Para governar e legislar existem governos e parlamentos. Os poderes Executivo, Legislativo e Judicial não se prendem de forma alguma com um regime republicano ou monárquico, são questões totalmente independentes, como questões independentes são as da Democracia ou da Autocracia.

O rei é educado fora do ambiente partidário; o rei não vota, o rei não se candidata, o rei não precisa de ser eleito nem de se subjugar a essa necessidade e interesses.
O rei é educado tendo como ideologia o seu país e o seu povo, a união da sua nação.
O rei não vai ser presidente de uma qualquer empresa pública, ou privada, não vai pedir nem aceitar um "job dos boys". O rei não vai ser primeiro-ministro, ou segundo ou terceiro, nem deputado, nem presidente da câmara ou da junta, ou do Sporting ou do Benfica.

O rei é a bandeira de um país mas com uma consciência e uma voz. O rei permanece como símbolo da nação e do povo quando as eleições modificam as legislaturas entre as esquerda e a direita, entre a boa ou má gestão do senhor A ou do senhor B.

Ah pois, então e os privilegiados? A nobreza... os marqueses, os condes, etc?

Privilegiados? Os marqueses, os condes, etc? Não me gozem!
Há alguém que seja privilegiado por ser conde ou duque, que se encontre acima da lei, acima dos direitos e deveres de cidadão, em qualquer uma das monarquias democráticas europeias?

(Aliás, deixemo-nos de redundâncias porque não existe qualquer monarquia europeia que não seja consolidadamente democrática; já das repúblicas não se poderá dizer o mesmo).

Privilegiados, sim existem, em todo lado, uns por conquista ou herança - legitimamente adquiridas - outros...

Outros de quem nem vale a pena falar, nós por cá vêmo-los às dúzias, impunes e divertidos proclamando a sua inocência e inimputabilidade aos quatro ventos, democraticamente descarados, eleitos, nomeados.

Comemorem lá o centenário da república, é verdade faz 100 anos, mas não a venham identificar com as conquistas democráticas, não atirem areia aos olhinhos do Zé Povo que já anda cegueta há que tempos.

E já agora, não se esqueçam de que a república não nasceu de uma revolução de cravos ou rosas, nasceu de um assassinato, de um duplo assassinato - que nem sequer reunia o consenso da lide republicana ; nem rosas e cravos se lhe seguiram, de 1910 a 1927... Nem vale a pena falar nisso, quanto ao depois... Nisso nem vou falar

 

Sem comentários:

Enviar um comentário