A CONVENÇÃO
O Partido Republicano (já) não existe
Das eminentes figuras que iluminavam a ribalta do partido quando Trump tomou a presidência, nem uma esteve presente no primeiro dia da convenção e, aposto as minhas fichas todas, não haverá sombra deles durante o desenrolar da reunião da seita trumpista adoradora do fundador da projectada dinastia
O concílio foi aberto com os discursos mais fundamentalistas do movimento MAGA/Fraude Eleitoral /6de Janeiro
A evocação do anti-semitismo - não centrado no actual Estado de Israel mas o propagado pelo regime nazi - foi abordada por, pelo menos, 3 dos 6 oradores em "prime time" que antecederam a chegada de Trump (a bem da sanidade mental que me resta não ouvi todos): a indescritível Marjory Taylor Greene com o seu habitual arrazoado de parvoíces e mentiras, o contestadíssimo Charlie Kirk, tido como uma aberração mesmo dentro do seu partido, rei das teorias de conspiração como é recorrente em quem fala do que nada sabe, evangélico de carreira e de proveitosos negócios, Kristi Noem, governadora do Dakota do Sul, que começou com este mimo: “Fui governadora tanto sob o presidente Trump como sob Joe Biden, e as pessoas perguntam-me constantemente: ‘Qual é a maior diferença? E digo-lhes que o presidente Trump honrou a Constituição.”. A partir daqui está tudo dito, que Trump foi "processado injustamente" ou a "cabala das eleições de 2020", sim, pois, já sabemos. Também merece uma referenciazita o governador do Carolina do Norte, Mark Robinson, homem do NRA, citador de Hitler, que recentemente (05/07/24) opinou durante um sermão numa igreja (Lake Church em Bladen County ) : «Some folks need killing.»/“Algumas pessoas precisam de ser mortas.”. Seria uma premonição?
É isto o "prime time" da abertura do que foi o Partido Republicano. Uma tristeza, uma angústia, a formação de uma tempestade negra
A escolha do senador J D Vance para vice-presidente...
Vance, um feroz crítico de Trump em 2015/16, chamou-lhe idiota, chegou a pôr a hipótese de tapar o nariz e votar em Hillary.
"In an interview with NPR in August 2016, Vance said he might even vote for Clinton".
“I think there’s a chance, if I feel like Trump has a really good chance of winning, that I might have to hold my nose and vote for Hillary Clinton,”
Quando se iniciou a campanha para 2020 Vance descobriu que " Trump foi tão bom presidente..." , como poderia não o apoiar? Apagou os seus Tweets de 2016 e foi à luta, à sua luta.
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9 Outubro 2016 . 1 mês antes das Presidenciais |
Agora teve um empurrãozinho de Elon Musk, o que fez brilhar os olhinhos gananciosos de Donald Júnior: "Daddy, o Vance é fixe e mexe-se bem em Wall Street". (O Don Júnior não percebe que está a dar um tiro no pé, se Vance entrar na Casa Branca será candidato às presidenciais de 2028, certinho como o Sol mesmo num dia de chuva. Talvez depois... Depois passou, o herdeiro do trono, após a hipotética regência de Vance, é o benjamim, Byron, o único que aos 18 aninhos está a ser (en)formado para isso seguindo os trâmites de uma monarquia
Nascido pobrezinho, abandonado pelo pai e retirado à mãe toxico-dependente , Vance cedo mostrou ser um rapaz cheio de iniciativa.
Acérrimo opositor da ajuda financeira e militar à Ucrânia (Musk sabe quem escolhe...) aí está ele, aos 39 anos a fazer o caminho para a Casa Branca apoiado no braço daquele a quem chamou mentiroso, repreensível e idiota mas as subidas ingremes requerem um bom cajado
Eu sei que parecerá um exagero mas, transposto no tempo, na geografia e no marketing, senti um vislumbre do clima obcecado da saudação ao ditador, da saudação de um deus humano acima dos meros mortais que necessitam de um guia para a luz. E depois aquele inexplicável atentado... Inexplicável como aconteceu, inexplicável o tiro na cabeça que feriu uma orelha enquanto um bombeiro ao lado caia baleado fatalmente.. Um imortal. Falavam de divina providência, de um milagre concedido ao Eleito pela graça de Deus, na sua qualidade messiânica.
Tenhamos presente que não se trata de um comício composto por seguidores, é suposto tratar-se de uma convenção oficial de delegados do partido que lidera o Congresso para a escolha de um candidato presidencial.
Fora a convenção num estádio e teríamos um remake não militarizado de 1936. Um mundo alternativo, uma realidade paralela, o absurdo em marcha
Nada disto é normal
Uma coisa sobressai, a expressão de Trump mudou, completamente
Não estou a dizer que o homem mudou, não sei e duvido, estou a constatar que a expressão, a linguagem corporal é inequivocamente diferente. Inequivocamente não está bem, não está à vontade, não se sente como peixe na água como quando habitualmente preside a uma enorme reunião de adoradores. Pelo menos neste primeiro dia foi assim
Aguardemos pela versão de Trump que veremos dentro de dias discursar nesta convenção, perante a América, perante o mundo
Por último, e enquanto as eleições não chegam, vale a pena focar o designado "Project 2025"
O primeiro passo foi a sagração da Imunidade Presidencial pelo malfadado Supremo Tribunal Federal arremessado por uma maioria de juízes enfeudados . Trump não se preocupa com a jurisprudência que daí advém, na sua cabecinha loira acabaram-se os presidentes democratas, liberais, da "radical left", como ele gosta de espalhar aos quatro ventos (como se isso fosse coisa que exista significativamente nos EUA)
Não vou gastar muitos bytes a debitar sobre o tenebroso projecto, a página oficial com aquilo que querem deixar transparecer, por agora, encontra-se AQUI com várias ligações mimosas
Na página que o Project 2025 publicou na Wikipedia pode ler-se (traduzido):
«O Projecto de Transição Presidencial 2025, também conhecido como Projecto 2025, é uma iniciativa organizada pela Heritage Foundation com o objectivo de promover uma colecção de propostas políticas conservadoras e de direita para remodelar o governo federal dos EUA e consolidar o poder executivo caso Donald Trump vença as eleições presidenciais de 2024»
Quando, recentemente Biden disse que o Projecto 2025 destruiria a América e o Partido Democrata tentou chamar a atenção dos eleitores para a organização que o sustenta, Trump apressou-se a publicar na Truth Social, a sua rede social:
«Não sei nada sobre o Projecto 2025. Não faço ideia de quem está por trás disso. Discordo de algumas das coisas que estão a dizer e algumas das coisas que estão a dizer são absolutamente ridículas e abismais.» Eu não acredito que Trump usasse a expressão "abysmal" saída da sua cabecinha, alguém lhe disse "demarca-te lá disto por agora, ainda é cedo, vai dar bronca". A verdade é que a organização está pejada de aliados e colaboradores de Trump.
No início de Julho, o presidente da Heritage, Kevin Roberts, deu uma eloquente entrevista ao podcast "War Room", fundado pelo ideólogo de Trump Steve Bannon, sobre o Projeto 25 não se inibindo de levantar a perspectiva de violência política :
“Estamos no processo da segunda revolução americana, que permanecerá sem derramamento de sangue se a esquerda o permitir”
As consequências disto são inimagináveis, um mundo novo emerge e não vai ser agradável de ver, muito menos de se viver