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A PASSADEIRA DA VERGONHA

 É de facto uma passadeira da vergonha, a única coisa que tem de aproveitável é o nome. Usando uma expressão idiomática bem portuguêsa quando menos é mais, diria que é a "passadeira da pouca vergonha". 

Eu não sou católica e estou envergonhada, como portuguêsa.

A forma como esta coisa foi inicialmente divulgada em 99% das notícias fez transparecer que a tal passadeira teria sido colocada "oficialmente" e iria permanecer durante a visita papal. Do mal o menos, não é assim, não era imaginável que fosse mas desde que o outro evocou a solução para os desagrados como «Habituem-se» já estou por tudo, habituadíssima ao inimaginável

Depois de muitas reacções e indignações, e depois de muito esgravatar pelos media, consegui encontrar o relato dos factos quando começou a ser divulgado com as declarações do presidente da CML, Carlos Moedas que, com o bom humor possível, relegou a "gracinha" para os protestos efêmeros e explicou que a passadeira seria substituída pela destinada ao local. «São todos bem-vindos» disse, ou seja, "eu sou  democrata e não me amofino com provocações". Adiante.


O tal artista, que até tem umas coisas giras e outras que nem-por-isso,  poderia ter razão se o seu protesto fosse dirigido à corrupção e regabofe dos dinheiros neste nosso país entregue à bicharada, como pretende fazer acreditar nas suas declarações mais públicas. 

Mas não foi. 

Não foi e isso é óbvio nas suas lamentáveis primeiras palavras no  Instagram. Diz ele:

Multinacional italiana? Habemus Pasta? Protesto pela situação económica do povo my ass! Se fosse não seria assim que se faria. E ele sabe.
Portugal é um Estado laico cujo povo é, maioritária e indiscutivelmente,  católico romano.
Pergunto eu, para quantas causas e iniciativas legais, sociais, remendos financeiros etc., descontam os portuguêses, sem apelo nem agravo, quer concordem quer sejam contra? Ora...

Obviamente que o que está aqui em causa não é - de todo - o investimento de dinheiro público, é a visita papal que faz nervoso e raivinhas a uma minoria da população.

Os custos não são a questão. Sobre o muito que fica até muitos anos depois do Papa partir nem uma palavra; No que toca à CML, do palco ao parque-pulmão com 30 Hectares do Tejo/Trancão e a ponte ciclo-pedonal (que faz a ligação entre Lisboa e Loures permitindo o percurso na frente ribeirinha desde Vila Franca), equipamento para os bombeiros incluindo novas ambulâncias, para a polícia municipal, para a proteção civil, novas infraestruturas públicas na cidade (p/ex. o nº de bebedouros de rua foi duplicado - 200 p/400) e tudo isto dentro do orçamento inicial (não estamos habituados...)

Quando os "protestadores" forem largar três dígitos de euros para assistir a um qualquer concerto a ter lugar naquele palco terão esquecido « as muitas pessoas que lutam para manter as suas casas, o seu trabalho e a sua dignidade » 

 Se começássemos a discutir os dinheiros mal gastos, mal parados, mal escondidos e os orçamentos largamente ultrapassados que saem dos bolsos dos portugueses para encher uns outros quantos nem chegaríamos ao investimento para a visita papal, estaria bem no fundo de uma lista escandalosa e, também ela, vergonhosa. No entanto, à parte o parlapier que vai ocupando os media, não vejo protestos na rua, nem artistas indignados, vejo um soma-e-segue inconsequente que deixa a malandragem que gere as massas, e não só, infinitamente impune.
 Ninguém a irá discutir, por várias e  diversas razões, nem ninguém irá tecer "passadeiras da vergonha" sobre os Ajustes Directos feitos pelo governo - 83,50% de todos os contratos para as JMJ celebrados (Link*) . Nem sobre todos os outros inúmeros Ajustes Directos, indeminizações,  aos primos, aos camaradas, aos tipos dos "saco azul mais giro", aos que são pagos para calar e favorecer. 

É de facto uma vergonha que se mascare de "acto de protesto pelas condições de vida do povo" um protesto que tem como alvo o Papa; Receber um convidado colocando "à porta da sala" um tapete que diz simbolicamente: «A tua visita saí-nos mais cara do que podemos pagar, é um gasto injustificado» não se faz a alguém que nunca levantou um dedo ou uma palavra contra o nosso país ou contra o nosso povo, aliás contra nenhum.  As opiniões do autor da passadeira são assunto e problema dele; O fim, este fim, a que a passadeira dele se destinou é assunto e problema meu. E de milhões de portuguêses. Não fora o Papa e, aposto as minhas fichas todas e mais algumas, que a conversa dos dinheiros públicos não se colocaria. Não me atirem areia para os olhos, incomoda-me, não gosto, não tolero calada.

Neste blog, onde escrevo desde Julho de 2007, já falei de tudo e mais alguma coisa, há no entanto dois ou três temas que não abordo, nunca abordei, porque os considero demasiado pessoais; um deles é a religião. Eu sei que não é a visão mais realista mas, em mim, a religião não é uma questão política ou social - chamem-me ingênua mas não é por ingenuidade - tenho-a como uma questão espiritual, íntima e séria. Como já disse, não sou católica, o que, neste caso, é totalmente irrelevante, mas  faço questão de afirmar, ao abordar esta vergonha, que não é de religião que falo, é de Respeito, de Dignidade, de Bom senso, de polidez até. E de falsos pretextos

Estou envergonhada porque respeito o Papa Francisco, um homem de excepcional coragem, de inteligência brilhante, de uma invulgar espiritualidade. 

Não tem de ser desrespeitado por ser católico, não tem de ser desrespeitado por ser o Papa, líder espiritual de cerca de 1.400.000.000 milhões de pessoas (1,4 Mil milhões) que o veneram, exceptuando talvez uma franja insignificante de católicos mais fundamentalistas nas leis e menos cristãos na tolerância e empatia humana

Estou envergonhada porque o caminho que leva ao palco onde esse homem excepcional se vai dedicar à Juventude Mundial com indubitável sacrifício físico, esteve atapetado "para a fotografia a divulgar ao mundo" com o simbólico dinheiro dos portugueses "assim mal gasto", o dinheiro dos portugueses que seria suposto o Papa pisar... 

Ó rapazinho, perguntaste alguma coisa aos portuguêses ou decidiste, em causa própria, ser o seu porta-voz? Foi uma ideia que já te terá rendido umas boas massas... Vais distribuí-las por alguns portuguêses "que lutam para manter a sua dignidade"? Doa-la a uma instituição de apoio social?  

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