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"A.O." : A EXPLICAÇÃO DO ÓBVIO

 Uma vez mais, e não demais, VGM expõe aquilo que qualquer Português com um mínimo de bom senso e bom gosto compreende.

O que não se compreende são as águas mornas em que Portugal se vai deixando boiar nesta questão, já absurda, do tal suposto "Acordo ortográfico", que não existe em parte alguma senão, sem força de lei mas com prepotência, na pátria da língua portuguesa.

Fomos dos primeiros países europeus a adoptar as matriculas automóveis europeias, numa urgência modernista; somos muito "práfrentex". Lastimável é que não tenhamos sentido essa urgência em questões bem mais importantes, fundamentais.
Os bons cobres da União Europeia, que entraram a fundo perdido, serviram toda a espécie de "urgências" mas não as fundamentais - para essas ficamos sempre à espera de um puxão de orelhas que nos meta na ordem, enquanto podemos disparatar, disparatamos.

Vão lá dizer aos britânicos, ou até aos espanhóis, que na América do Norte ou na América do Sul há mais gente a falar e a escrever inglês e castelhano para ver se eles entram em acordos deformantes das suas línguas... Um absurdo. Obviamente.

Nós, muito "práfrentex", e cheios de vontade de demonstrar o quanto respeitamos os povos que se exprimem na nossa língua,  vamos logo de arquinho e balão na primeira marcha de regabofe.
Respeitamos muito os povos que se exprimem na nossa língua, só não respeitamos a nossa língua, nem o povo português.

Resta-nos então esperar que alguém, dos outros povos, resolva por nós o absurdo que criamos e deixamos continuar?
Pois, parece que sim.
Que vergonhaça! Que triste figura!

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«O cadáver adiado»

VASCO GRAÇA MOURA
 2 Janeiro 2013 - In "Diário de Notícias"

«No Brasil, tratava-se fundamentalmente de sacrificar o trema e o acento agudo em meia dúzia de casos. E ninguém se resignava às regras absurdas de emprego do hífen... Com isso, bastou o abaixo-assinado de uns 20 mil cidadãos para se adiar a aplicação de uma coisa trapalhona denominada Acordo Ortográfico (AO). Os políticos ouviram a reclamação, estudaram-na e assumiram-na, e a sr.ª Rousseff decidiu.

Em Portugal, o número de pessoas que tomaram posição contra o AO já ultrapassava as 120 mil em Maio de 2009. Hoje, e considerando tanto o Movimento contra o AO de então como a actual Iniciativa Legislativa de Cidadãos (ILC) com a mesma finalidade, esse número é incomparavelmente mais elevado.

Portugal bem pode propor a todos os quadrantes ideológicos e parlamentares da sua classe política que se assoem agora a este cruel guardanapo.

Faltou-lhes a coragem de respeitar as opiniões autorizadas, a capacidade de reflectir com lucidez sobre o assunto, a vontade cívica de se informarem em condições.
Acabaram a produzir este lindo serviço, com a notável excepção do relatório Barreiras Duarte, aprovado por unanimidade na Comissão Parlamentar de Ética, Sociedade e Cultura (Abril de 2009), mas que não teve qualquer efeito prático.

A CPLP, ao engendrar o torpe segundo protocolo modificativo do AO, violou sem escrúpulos o direito internacional e traiu a língua portuguesa. Não serve. Mostrou total inconsciência, incompetência, incapacidade e oportunismo na matéria.

Agora, é evidente que, de três, uma: ou o Brasil vai propor uma revisão do AO, ou tratará de a empreender pro domo sua sem ouvir os outros países de língua portuguesa, ou fará como em 1945, deixando-o tornar-se letra morta por inércia pura e simples.

No primeiro caso, mostra-se a razão que tínhamos ao insistir na suspensão do AO, a tempo, para revisão e correcção. A iniciativa deveria ter sido portuguesa e muitos problemas teriam sido evitados.

No segundo caso, mostra-se além disso que continuamos a ser considerados um país pronto a agachar-se à mercê das conveniências alheias. Com a desculpa, a raiar um imperialismo enjoativo, da "unidade" da língua, em Portugal haverá sempre umas baratas tontas disponíveis para se sujeitarem ao que quer que o Brasil venha a resolver quanto à sua própria ortografia. Foi o que se passou em 1986 e 1990.

No terceiro caso, mostra-se ainda que ficaremos reduzidos a uma insignificância internacional que foi criada por nós mesmos.

Mas, em qualquer dos casos, a situação será muito diferente da actual.

O Acordo Ortográfico não ficará incólume e as suas regras serão revistas e modificadas. Ninguém esconde no Brasil esta necessidade de revisão e correcção, tão cultural, social e politicamente sentida que está na base do adiamento decretado.

Se as regras vão ser modificadas, e quanto a este ponto não pode subsistir qualquer espécie de dúvida, será um absurdo absoluto que se mantenha a veleidade de as aplicar em Portugal na sua forma presente.

Não se pode querer contestar oficial ou, sequer, oficiosamente a existência de três grafias, nada menos de três, como resultado grotesco de uma tentativa sem pés nem cabeça de uniformização delas em todos os países que falam português: a brasileira, a angolana e moçambicana e a irresponsável que é a portuguesa.

Torna-se imperativo o reconhecimento oficial de que a única ortografia que está em vigor em Portugal é a que já vigorava antes das desastrosas pantominas que foram empreendidas pelo Governo Sócrates.

No meio desta vergonha, o mais simples é:
  • a) reconhecer-se que o AO nunca entrou em vigor por falta de ratificação de todos os estados signatários; pressuposto essencial da sua aplicação que é o vocabulário ortográfico comum que nem sequer foi iniciado;
  • c) suspender-se tudo o que se dispôs em Portugal quanto à aplicação do AO, nomeadamente no plano das escolas, dos livros escolares e dos serviços do Estado;
  • d) tomar-se a iniciativa de negociações internacionais com vista a uma revisão e correcção do AO por especialistas dignos desse nome. 
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O Acordo Ortográfico é tão mal feito que nem o Brasil o aceita... Logo à nascença, já era um cadáver adiado. Com vénia de Fernando Pessoa, agora não se pode deixar que, sem a necessária revisão, ele procrie seja o que for.»


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