::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::

THE BRITS

Olhando para o Partido Conservador destes últimos 14 anos pergunto-me como conseguiu o Reino Unido permanecer um dos G7...

BREVE HISTÓRIADA DO DECLINIO BRITÂNICO REGIDO PELOS CONSERVADORES

David Cameron, eleito em 2010 (em coligação com os Liberais Democratas) foi a última cabeça coerente e arrumada ao leme do UK por parte dos Conservadores - até à escolha de Rishi Sunak, contrariados mas desesperados, já lá vamos...
Cameron foi reeleito em 2015, sem coligações e com mais do que a maioria requerida; 
Face à derrota, o líder trabalhista Ed Miliband,  demitiu-se abrindo a porta a Jeremy Corbin, um socialista radical de esquerda a tomar as rédeas de um partido social-democrata, a coisa não poderia correr bem. 

Pressionado pela ala direita do partido conservador Cameron cometeu um erro, crasso: admitiu a realização do referendo Brexit; acreditou que os britânicos, a maioria dos britânicos, veriam mais longe do que os limites dos seus quintais, compreenderiam que, no mundo do Séc. XXI , as fonteiras nacionais são ilusórias, as fronteiras existem, sim, onde se delimitam "os poderes", e esses requerem uniões, coesão além fronteiras nacionais para se poderem impor e subsistir. 
Isto é hoje inegavelmente evidente mas em 2015 o que é agora evidente apenas começava a tomar forma: a invasão da Crimeia em 2014, a candidatura de Trump em 2015, a interferência da Rússia em eleições democráticas e a sua intervenção militar na guerra da Síria em Setembro do mesmo ano quando os rebeldes, armados pelo Ocidente, começavam a ocupar espaços estratégicos, para citar apenas o mais óbvio. 
Em 2016 os dados estavam lançados, foi a consolidação do sonho populista, nascido em noites de maligna insónia nos aposentos do Kremlin para assombrar os dias do Ocidente. Hoje é vivido como uma vitória da direita radical. Quanta ilusão...  Uma maioria inqualificável dos eleitores populistas ainda hoje não acredita nisto, por mais que se meta pelos olhos dentro. 
Por pouco houve um Brexit, por pouco Trump ganhou a presidência - assente no Colégio Eleitoral. Na Síria caiu Aleppo, com os curdos os americanos conquistaram Palmira e, pouco depois os traíram deixando-os à sua sorte e às garras de Erdogan; deu-se uma das maiores crises humanitárias que o mundo conheceu e, sequentemente, quebrou-se o frágil cessar-fogo entre os EUA e a Rússia; O golpe de Estado na Turquia falhou em poucas horas; O Trans-Pacific Partnership (TPP) - acordo comercial entre os EUA e 11 países asiáticos - sucumbiu no Congresso após a vitória de Trump, ainda durante o mandato de Obama; A Coreia do Norte realizou testes de mísseis e testes nucleares sem precedentes sendo designada por Obama, ao deixar a Casa Branca, como a maior ameaça mundial. E face à vitória do Brexit Cameron demitiu-se. O pesadelo britânico materializou-se
Ascende ao governo britânico a doce Theresa May nomeada pelos líders conservadores. Senhora honesta e cumpridora teria provavelmente feito um bom lugar em qualquer posto que requeresse organização sem confronto, sem necessidade de pensamento lateral. Terá sido escolhida para ser manipulada, incapaz de um pensamento mais "fora da caixa", com a capacidade criativa de um peixe num aquário redondo, resistiu à manipulação por ser integra e teve a agradecer a vitória nas eleições de 2017, sem maioria, à oposição liderada por Corbin, visto de lado por muito bom trabalhista.  Após longas conversações fez uma aliança parlamentar como Partido Democrático Unionista (DUP, da Irlanda do Norte) o que veio a complicar, ainda mais, as negociações do Brexit com a UE ( A Irlanda, tal como a Escócia, "chumbou" o Brexit)

Menos de dois anos depois May era traída pelo seu partido, enfraquecida pelas desventuras do seu mandato: as inconsistentes negociações do Brexit, rejeitadas pelo DUP, a instabilidade económica crescente, a desvairada, e insultuosa, visita de Trump ao UK, os resquícios da campanha do Brexit inflamados por Nigel Farage e Boris Johnson -  foi-lhe retirado o apoio parlamentar.  Em Maio de 2019 anunciou a sua demissão assim que um novo líder conservador fosse escolhido pelo partido

Em Julho de 2019, após conturbadas e demoradas eleições dentro do Partido Conservador, entra Boris Johnson. 
Sobre este chanfrado ambicioso, que em pequenino queria ser rei de Inglaterra, pouco haverá a dizer que não tenha sido óbvio aos mais desatentos..  Arregaçou as mangas para o que viria a ser uma desastrosa conclusão das negociações do Brexit, quase exasperando Jean-Claude Juncker e elevando aos picos a paciência de Michel Barnier

Foi confirmado eleitoralmente como primeiro-ministro em Dezembro de 2019, ainda no período de transição do Brexit e antes das suas consequências se começarem a sentir. De referir, en passant, que a Comissão Eleitoral classificou a campanha de Johnson como: "inapropriada e enganadora", e o Twitter afirmou que tomaria "acções correctivas decisivas" se houvessem "novas tentativas de enganar as  pessoas".  Entre outras vergonhas o Partido Trabalhista obteve documentos governamentais que mostravam que Johnson tinha enganado o público sobre o acordo dos conservadores  Brexit / UE, especificamente em relação aos controlos alfandegários entre a Grã-Bretanha e a Irlanda do Norte, que fazem parte do Good Friday Agreement , que Johnson disse que não existiriam

Sucederam-se os escândalos dentro do Partido Conservador, no seu governo e nas suas fileiras parlamentares; a economia caía a pique, o porto de Dover parecia um lava-loiças entupido devido à congestão das importações/exportações, a Irlanda do Norte associou-se à Republica da Irlanda na defesa da manutenção das suas fronteiras abertas, a Escócia via-se encurralada devido à queda drástica das exportações - o independentismo espreitava -  faltavam bens, sobretudo alimentares, nos mais corriqueiros super-mercados. E chegou o Covid... Johnson apostava na imunização por contágio, foi o descalabro. Depois de hospitalizado durante uma semana  com 3 dias em UCI, cedeu ao confinamento, ao dos outros, no Number10 havia festarolas e reuniões de copos e ministros a atravessarem condados. Morreram cerca de 250 mil pessoas. 
Em 2020 os britânicos retiravam-se do Afeganistão a reboque dos EUA e a população acompanhava incrédula a desorganização, a falta de apoio às tropas, à embaixada, aos colaboradores afegãos; Johnson descartava-se atirando a responsabilidade para o Ministério da Defesa e seguia animado. O NHS afundava-se, o Partido Trabalhista pediu um aumento de 45%  para o seu financiamento que foi chumbado.
Johnson aguentou-se numa corda bamba até Julho de 2022 altura em que se demitiu, do governo e de  líder partidário após ter vindo a público mais um escândalo por "má conduta sexual" do vice-líder da bancada parlamentar, nomeado por Johnson com conhecimento do processo; vários ministros se demitiram abrindo nova crise governamental

 A 6 de Setembro de 2022, entra Liz Truss, escolhida, em detrimento de Rishi Sunak,  pela ala mais conservadora do partido e próxima de Johnson; um desastre total que ficou conhecido como o mandato  mais curto da história do Reino Unido. Demitiu-se a 25 de Outubro

No mesmo dia da demissão de Truss foi eleito como primeiro-ministro , pelo partido, Rishi Sunak.
Sunak terá cometido um acto de bravura, necessidade ou busca de prestigio não foi por certo; ex-ministro das finanças conhecia bem a situação em que se encontrava o UK. 
Foi tarde, depois de Johnson a situação económica e social era perto de calamitosa: o NHS estava em cuidados intensivos e o descontentamento atingira picos incontestáveis. Conseguiu controlar a inflação mas não se reflectiu no custo de vida, uma crise de habitação sem precedentes e, o coup de grace, a ideia peregrina de enviar imigrantes para o Rwanda como se fossem gado de exportação. 
Após Cameron, depois de mais 4 governos em 8 anos, o Partido Trabalhista tinha a vitória assegurada.

 Sai Sunak...

Sunak é um Senhor. É a prova provada de como o Partido conservador apostou mal ao longo de demasiados anos, ao pé dele Johnson é um labrego, em todos os sentidos, pessoalmente, socialmente e politicamente; foi o único primeiro-ministro da história que, poucas horas após ter sido formalmente empossado pela rainha, revelou detalhes da conversa entre ambos

Sunak é um Senhor e assim o demonstrou, uma vez mais, ao deixar Downing Street; assumiu uma total responsabilidade que não tem, basta olhar uns poucos anos para trás. Referiu-se ao homem que o venceu como sendo  "um bom e decente homem que eu respeito" e  que "o seu sucesso será o nosso sucesso, desejo-lhe o melhor". É preciso ter pinta, caramba. 
(Tal e qual como Farage que, desiludido com 1/4 dos deputados que esperava, rosnou: "O Partido Trabalhista vai ter-nos à perna, vamos fazer-lhes a vida negra")


Entra  Keir Starmer. 
E Sir Starmer também é um Senhor. É homem de uma seriedade invulgar no meio político. Quando se tornou líder do Partido Trabalhista, em 2020, pegou num partido esfrangalhado, radicalizado e com a pior votação desde 1935. Expulsou Corbin do Parlamento não lhe tolerando mais o continuo discurso anti-semita. Em 4 anos, difíceis, elevou o partido a uma estrondosa vitória, reuniu um governo no qual inseriu independentes por considerar que serão aquelas as pessoas mais eficazes, foi buscar alguns ex-ministros de Blair por considerar que serão mais experientes. E veio para trabalhar, indubitavelmente.




Sem comentários: