Se há coisa que me chateia à face da Terra é a dor-de-cotovelo: só vem de quem é pequeno mas se julga maior, de quem é complexado, de quem não compreende a verdadeira natureza do poder, de quem é rasca, pindérico de alma. A dor-de cotovelo é um drama nacional que grassa e cresce como erva daninha.
Quando a Manuela Ferreira Leite foi candidata a primeiro-ministro nas legislativas que lhe assistiram, passo a expressão, o Pedro Passos Coelho fartou-se de lhe morder a nuca. Não achei nada bonito, na altura achei até muito feio, para usar uma expressão que não me leve a alongar sobre o assunto.
Continuo a não achar bonito mas hoje pergunto-me quais as razões que o levaram a proceder assim e fico-me com a interrogação.
Ferreira Leite não aguenta ver "um puto" que conseguiu fazer o que ela ficou longe de conseguir: vencer Sócrates nas eleições, chefiar um governo. Não aguenta e rosna, com garras e dentes. Não é o sofrimento popular que a tira do sério e a leva a dizer coisas, de compostura duvidosa, que ficam mal a quem se pretende liderático. Manuela quer arrasar e, quando arrasa, não vê nada senão o seu alvo, arrasa indiscriminadamente, o povo que saiba que VAI MORRRRER! De fome, de frio, de calor, de estafa, de deseperança mas VAI MORRRRER!
Do Cavaco nada, ou quase nada, me surpreenderá. O Cavaco vem de origens humildes, tudo bem.
Tudo bem? Não, não para ele. O Cavaco quer estar acima, precisa sentir-se acima; precisa provar que venceu, que se licenciou com a mais alta classificação do seu ano, que se doutorou na Universidade de York. Pois, não chega. Há coisas que não vão lá com cursos nem com dinheiro, nem tão pouco com as hierarquias sociais; uma das coisas que exigem é humildade, e essa, Cavaco renega-a por necessidade interior, é um falso manso, um sonso. Cavaco não é honesto, é honestozinho, bom pai de família, trabalhador. Honesto vem do carácter, honestozinho vem de uma educação judaico-cristã-pequeno-burguesa.
Cavaco pouco diz, espera que haja quem diga. Calou-se com Sócrates durante anos e agora salta-lhe a tampa de Pai-de-família-que-exige-respeito e dá-lhe para falar. Fora de tom, fora de horas, fora de propósito. E farta-se de dizer disparates por mais que o faça com um ar compostinho e bem intencionado. Cavaco não grama quem não o olha de baixo para cima, dá-lhe conta das boas intenções. Enfim, cada um tem os seus dramas pessoais...
O PS é um reino de oportunistas bajuladores que mantêm a face perante o líder, é o líder quem distribui as cartas e talvez ainda calhe bom jogo. É, mais do que qualquer dos outros, o partido dos "Jobs for the boys" - quando não há jobs em distribuição gera-se alguma acalmia, o líder sobressai, à excepção de quem quer a cadeira do líder, claro.
No PSD há uma nova geração, com bons e maus mas apenas tolerados, obrigatoriamente, pelos restos dos "barões do PPD".
Esta nova geração não é obediente e discreta como, por exemplo, António Capucho foi no seu tempo. Esta nova geração, bem ou mal, quebra as amarras aos seus mentores, uma chatice! E não olha de baixo para cima por dá cá aquela palha, a antiguidade não é um posto. Nem Ângelo Correia, tipo de mente aberta, nem Marcelo Rebelo de Sousa, que não conhece lealdades, levam isto com bom modo, fartam-se de espernear cada um para seu lado e estão muito bem acompanhados. Cavaco lambe-se quando ninguém está a olhar.
Lamentável.
E o CDS/PP? Lembra-me uma musiqueta de Verão que andou aí na berra:
«Follow the lider, lider, lider, follow the lider, Let's Go»
Seguir o líder sim, é bonito, mas discretamente. Se o líder mandar discordar, pontualmente, discorda-se. Paulo Portas é um tipo invulgarmente inteligente ao que acrescenta uma educação muito acima da pimpineira nacional. É um bom maestro, mantém tudo bem orquestrado e os instrumentos prontos a entrar na altura certa. Não sei bem o que nele é mais relevante, se a inteligência, se a ambição, mas suspeito que seja a segunda e isso leva-o a resvalar... O chico-esperto que há nele leva-o a esquecer que nem todos os outros são parvos. Mais... há sempre alguém que chega para nos pôr no lugar.
O Paulo Portas é tema que tem pano para mangas... Por agora não me chega a linha para tanto.
Como é bom de se ver, hoje deu-me para deixar a oposição em paz, à excepção daquelas míseras quatro linhas dedicadas ao PS, só por amabilidade.
É que enquanto que as verborreias e desacatos vindos da oposição, por mais convictos ou demagógicos que sejam, fazem parte de um jogo político tão velho quanto o desejo pelo poder e as tácticas da sua conquista, as críticas expostas por membros dos partidos governamentais são, salvo raríssimas excepções, expressões de inveja mal disfarçada e traiçoeirismos de quem não conseguiu lá chegar mas almeja sordidamente apenas o insucesso alheio, doa a quem doer, prejudique-se o que se prejudicar, mesmo que seja o país.
Então não se pode discordar?
Pode e, em muitas circunstâncias, deve-se; mas utilizem-se os canais próprios em sede própria; diga-se o que houver a dizer, exponham-se razões, apresentem-se alternativas e soluções - viáveis.
Quando se opta por fazer o Carnaval nos meios de comunicação social, quando se persegue um protagonismo crítico sem qualquer espírito construtivo, sem qualquer outro conteúdo que não seja a crítica, o descrédito e a auto-promoção, não se vai a parte alguma. Mas é pena - bem podiam ir àquela parte...
Entre Manuela e Aníbal troca-se "uma carapuça" que serve a muito boa gente.
«Manuela Ferreira Leite não se importou em 2002 que estivéssemos todos mortos em 2012»
A Cavaco dedica-lhe o mimo de lembrar de um artigo seu, que deu que falar na época de António Guterres: "O Monstro" - sobre a despesa do Estado sob Guterres:
« "Muitas pessoas pensam que os serviços fornecidos pelo Estado não custam nada porque sofrem de ilusão fiscal e não se apercebem de que as despesas têm sempre de ser financiadas com impostos, presentes ou futuros". »De Ferreira Leite Ferreira Leite cita a sua frase lapidar, no mais próprio sentido do termo, quando a bela dama disse que é uma ilusão pensarmos que consolidamos as nossas contas nos prazos definidos pela troika. (e ela reza todos os dias para que tal não aconteça)
« "Estamos a tentar passar um atestado de estupidez aos credores"»O artigo, de Paulo Gaião (22 Out.), termina assim: