Desde aquele espetáculo degradante em que Trump e Vance fizeram tudo o que lhes veio à cabeça para humilhar Zelensky, Trump voltou a insistir nas redes sociais que « A Rússia está a bater em absoluto a Ucrânia no campo de batalha neste momento».
Kirill Kudryavtsev/AFP via Getty Images |
Mas será assim?
Depende do canal que se vê, do jornal que se lê, do que se pretende com a informação, ou desinformação divulgada, das fontes de informação. A única forma é cingirmo-nos aos factos mas mesmo com esses precisamos ter em mente que vivemos na época dos "factos alternativos" - expressão realista nascida na Casa Branca de 2016
"A Rússia está a bater em absoluto a Ucrânia" não corresponde à realidade no terreno mas é exactamente o que Putin precisa que Trump pense. A implantação nas mentes ocidentais que uma vitória russa é inevitável eleva Putin a uma imagem invencível aos olhos do Ocidente e, consequentemente, vai instalando a ideia de que a ajuda à Ucrânia é inútil, onerosa, desgastante em termos de material militar, recursos e impostos prolongando uma guerra "sem sentido". Este é o grande ponto com que Putin conta para fazer vacilar estadistas e povos. Por crença, conveniência, ou ambas, tornou-se claro que Washington se juntou a Moscovo.
Uma dessas áreas é Pokrovsk, cidade que as forças russas têm tentado capturar sem sucesso desde Agosto passado. Mikhail Zvinchuk, um antigo porta-voz do Ministério da Defesa russo que agora dirige o Rybar - um canal pró-guerra da "Telegram" com mais de 1,3 milhões de subscritores - publicou há poucos dias um relatório da linha da frente que refere que as forças russas sofreram "dolorosos reveses" em Toretsk, uma cidade mineira de Donetsk. Moscovo tinha declarado Toretsk “libertada” no início de Fevereiro. Há relatos semelhantes sobre Chasiv Yar, outra cidade da linha da frente onde os russos têm estado atolados.
** Sobre a "WarTranslated" - que publica o post na imagem acima, entre muitos outros, diariamente. É um blogger estónio, Dmitri, residente em Londres, que publica na Bluesky, Telegram e Twitter/X notícias e vídeos traduzidos para inglês. Uma boa fonte de informação fora dos "grandes media" com informação privilegiada. A sua apresentação:
«Durante mais de dois anos, fizemos a cobertura da guerra contra a Ucrânia e de temas associados, traduzindo dezenas de milhares de vídeos e materiais utilizados e vistos por meios de comunicação social, jornalistas, criadores de conteúdos e indivíduos.»
Abaixo um vídeo publicado ao final do dia 12 Março mostra Putin chegando a Kursk longe da cara sorridente e despreocupada que apresenta no Kremlin para divulgação em meios de comunicação social
O exército russo encontra-se num impasse, é uma sombra do que foi. As suas unidades de elite desapareceram abatidas pela resistência ucraniana logo nas primeiras semanas da guerra. As reservas de tanques, veículos blindados e até de camiões são perigosamente baixas; os soldados russos na frente recorrem a burros e cavalos para transportar mantimentos.
Os pequenos ganhos que a Rússia obteve ao longo do último ano e meio implicaram uma perda de vidas "inexplicável". Dados actuais de fonte aberta confirmam que cerca de 96.000 soldados russos foram mortos em combate mas provavelmente o número real será de pelo menos 160.000. Acrescentando os feridos graves, as perdas irrecuperáveis da Rússia em combate elevam-se a cerca de 550 000 soldados, de acordo com um relatório recente do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos. Há vídeos feitos por drones que mostram soldados russos a coxear, com muletas ou a rastejar em direcção às posições ucranianas. A sua missão final: actuar como esponjas de balas que revelam os ninhos de fogo ucranianos.A realidade na frente em nada se assemelha com a narrativa do Kremlin de uma Rússia com recursos infinitos numa marcha imparável - narrativa divulgada por Trump e pelo movimento MAGA: "Putin tem todas as cartas"
Igor Girkin, um dos mais salientes nacionalistas russos pró-guerra, actualmente a cumprir uma pena de prisão pelas suas críticas a Putin - por não ter prosseguido a guerra de forma suficientemente implacável - escreveu recentemente, numa nota da prisão, que a guerra está perdida. Segundo ele, a Rússia não atingiu nenhum dos seus objectivos estratégicos e as forças ucranianas estão em pé de igualdade com o exército russo e o fracasso do país na guerra significa que todo o seu futuro é sombrio. «A crise sistémica em que o nosso país se encontra ainda não tem perspectivas de resolução e vai aprofundar-se»
Yuri Kotenok, um relevante blogger de guerra na linha da frente, escreveu no Telegram «Os ucranianos estão a tornar-se mais ousados a cada dia que passa, contra-atacando e até empurrando-nos para fora de várias posições que defendemos. Existe uma grave falta de tropas para operações de assalto no sul de Donetsk.»
Alguns dos mais fervorosos russos pro-guerra estão a debater-se com a constatação de que a guerra não é a grande luta histórica que imaginavam mas uma catástrofe. Modest Kolerov, um bloguista ultra-nacionalista e antigo especialista do Kremlin, lamentou num post largamente difundido: «A guerra provou, sem margem para dúvidas, que a ‘Nova Rússia’ não é mais do que (...) uma pálida sombra da Rússia histórica - seja o Império Russo ou a União Soviética».
Este sentimento apenas ecoava na oposição mas tem vindo a infiltrar-se no campo pró-guerra, aquele que concebe, ou concebia, a Ucrânia como "terra de ninguém" pertencente à Rússia de pleno direito
Se a Rússia tiver alguma hipótese de ganhar esta guerra, não será devido aos seus feitos militares no campo de batalha, será porque Putin convenceu Trump, Vance e os seus acólitos MAGA, de que a Rússia detém todas as cartas de um baralho inexistente.
Aos 3 anos passados sobre os 3 dias em que Moscovo ia tomar Kyiv, a aposta de Putin é conquistar o poder afastando Zelensky; irá exigir eleições - e de eleições sabe Putin, muito. Trump irá dizer que as eleições são essenciais;
e
porque os povos europeus consideraram que o seu nível de vida não pode ser posto em causa para se fazer face ao rearmamento da Europa - é o pior dos luxos que nos pode minar: acreditar que o nosso nível de vida é nosso por direito - fatalmente porá em causa todos os preciosos "luxos" que tomamos por certos
Fontes: "WarTranslated"; ForeignPolicy; Alexey Kovalev
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